quarta-feira, 13 de abril de 2011

Da adega ao espaço gastronómico

Évora é uma cidade que só não encanta quem ainda não a visitou.

Recheada de monumentos que enchem o olho, tem tanto para ver e visitar que um dia é escasso, uma semana não chega e uma vida inteira provavelmente não é suficiente para conhecer todos os seus tesouros.

Assim, e para poder dizer que já tinha um pouco mais de Évora no meu hard drive, faço malas, junto a família no carro e após uma hora e alguns minutos estava a circundar as muralhas, passar por baixo do aqueduto, e seguir a estrada que indicava canaviais - desta vez o meu destino é o belíssimo e totalmente reestruturado Convento do Espinheiro, agora transformado num belo hotel histórico de luxo.

Segundo a lenda, por aqui houve a aparição da Virgem por volta do início do século xv, alguns anos após foi edificada uma ermida e, depois de se tornar um ponto de peregrinação, no ano de 1458, D. Afonso V ordenou a construção da igreja e mais tarde do convento.

A história prolonga-se por muito mais linhas e todas elas impressionantes e deveras curiosas, mas a razão da minha visita foi para conhecer um conto mais recente - a arte por detrás da cozinha.

Confesso que quando entrei para almoçar na antiga adega do convento, onde hoje é o restaurante Divinus, o chão de pedra, os vários arcos e abóbadas do tecto e a iluminação delicada quase toda artificial prenunciam que o ambiente está mais propício para o jantar do que para o almoço, mas o estômago não vê luz, por isso mãos à obra.

A ementa está dividida entre uma variedade de 6 petiscos alentejanos, 3 sopas e caldos, 3 entradas, 5 peixes, 5 carnes e 5 sobremesas. Além destas, pode optar por um menu de degustação com 6 experiências por 45 €, e foi mesmo esta a minha opção para o almoço.

Depois da surpresa do chefe, iniciei-me nas vieiras crestadas em azeite de alecrim, numa bisque de mar sobre cuscuz de coentros - o molusco bem cozinhado no ponto, exterior ligeiramente crocante e as guarnições a favorecerem em sabor enaltecendo o bivalve.

O peixe-galo braseado sobre um creme de aipo e emulsões de azeite em diferentes texturas estava um pouco seco na ponta, merecia maior cuidado.

O melhor da tarde foi o carré de borrego envolto em sementes de sésamo e papoila numa inspiração mediterrânea, em que a carne chegou à mesa num ponto rosé perfeito, enaltecendo a graciosidade do bicho, onde se notava a ausência dos sabores a sebo muitas vezes associados à peça.

Terminou-se com duas sobremesas: a tarte de requeijão e maçã numa redução de Mouchão e com gelado de rosa e uma fantástica subtilezas conventuais em três texturas.

À noite, como eu já esperava, o ambiente era mais favorável ao espaço e decoração, e as confortáveis cadeiras encarnadas de costas altas criavam uma simbiose agradável entre o clássico e o moderno.

À la carte iniciei a refeição nocturna com o escalope de fígado de ganso braseado com uma compota de tomate verde e cebola roxa - mais uma vez os pontos correctos denotavam coerência e técnica na cozinha, deste prato retirava a guarnição da pêra bêbada em massa brick, que de forma correcta equilibrava a gordura do foie, embora não me pareça uma boa combinação de palato.

O dueto de robalo e carabineiros corado sobre um risotto de amêijoa cristã ficou pela banalidade do certinho e terminei com a pedra de queijos alentejanos com uma gelatina de maçã e um gelado de mel.

Resta dizer que a carta de vinhos é excelente, havendo uma maior propensão, como não poderia deixar de ser, para os alentejanos.

O serviço de mesa foi sempre simpático e afável, apesar de algumas distracções momentâneas, facilmente corrigíveis.

Não tenho dúvidas em afirmar que fui, gostei e voltarei, para comer, dormir e viver o que o Convento do Espinheiro tem para oferecer.


Detalhes
Divinus
Convento do Espinheiro Hotel & Spa
Canaviais, Apartado 594
7002-502 Évora - Portugal
N 38.60077º, W 7.88841º
+351 266 788 200
www.conventodoespinheiro.com
reservas@conventodoespinheiro.com
Horário: aberto todos os dias das 12h30 às 14h30
e das 19h30 às 22h30
Preço médio: 55 €
Tipo de cozinha: regional alentejana contemporânea
Cartões: todos

Texto publicado originalmente no Lifestyle do diário OJE a 13 de Abril de 2011

Sem comentários: